Nota de Repúdio à Aprovação da Lei Geral da Copa na Câmara dos Deputados
Articulação Nacional dos Comitês Populares da Copa – ANCOP
Articulação Nacional dos Comitês
Populares da Copa (ANCOP) - 07 de março de 2012 - Na última sexta feira (02 de
março), o Secretário Geral da FIFA Jerome Valcke, em entrevista, disse que
precisaria “chutar o traseiro” dos governantes brasileiros para que agilizassem
os trâmites relacionados à organização da Copa do Mundo de 2014.
Agilidade, para Valcke,
significa rapidez para aprovar medidas que garantam os interesses mercantis da
FIFA. Definitivamente, acelerar a superação das mazelas da saúde pública, ou o
atendimento às dezenas de milhares de pessoas atingidas pelas chuvas, ou mesmo
pelas obras relacionadas aos mega-eventos esportivos não é a sua preocupação.
Tampouco interessa à entidade agilizar a redução da histórica desigualdade
social do país ou do déficit habitacional que assola suas cidades. Quanto à
nossa justiça, notoriamente morosa, celeridade para a FIFA diz respeito aos
procedimentos extraordinários e aos tribunais de exceção para julgar os crimes
especiais que pretende criar. A entidade visa, portanto, apenas seus
interesses/lucro em detrimento do bem comum e das necessidades da população.
Também os congressistas e os nossos governantes parecem pouco se importar com
os direitos sociais dos brasileiros. Onde está o suposto “legado social” dos
jogos? Até agora, nada encontramos que permita justificar as dezenas de bilhões
já investidos em nome da Copa e das Olimpíadas.
Com esta polêmica frase,
Jerome Valcke se referia à Lei Geral da Copa, fruto do Projeto de Lei 2330 de
2011, elaborado pelo governo federal e que tramitava, até terça-feira (06 de
março) na Comissão Especial da Câmara dos Deputados e foi aprovada, nessa
instância, na forma do texto consolidado pelo relator Vicente Cândido (PT-SP).
Atendendo ao cartola da FIFA, a comissão atropelou manifestações democráticas,
não permitindo a realização de um debate público sobre a lei em questão. No mesmo dia,
o deputado Jilmar Tatto (PT-SP) protocolou requerimento de urgência para a
aprovação da lei no plenário da casa, agendando-a para a próxima terça feira,
dia 13 de março.
A expressão grosseira “chute no traseiro
dos governantes brasileiros” utilizada pela FIFA não causa surpresa. A Lei
Geral da Copa já é, em si mesma, um verdadeiro “chute no traseiro” do povo
brasileiro. Ela constitui o documento central de um conjunto de leis de exceção
que vem sendo editadas nos três níveis federativos do país, de forma a garantir
que a Copa do Mundo maximize o lucro da FIFA, de seus patrocinadores e de um
conjunto de corporações nacionais, ampliando o canal de repasse de verbas
públicas a particulares e fortalecendo um modelo de cidade excludente, que
reproduz a lógica da especulação imobiliária e do cerceamento ao espaço
público.
A Lei Geral da Copa não é tão
“geral” assim. Em primeiro lugar, porque, longe de proteger o interesse
público, ela tem por base contratos e compromissos particulares, ou seja,
interesses privados. Além disso, não abrange a totalidade das intervenções no
ordenamento jurídico brasileiro para os mega-eventos, já que não é a primeira e
pode não ser a última das leis aprovadas sobre o assunto. Em cada cidade já
foram emitidas “leis de segurança”, “leis de isenção fiscal”, “leis de
restrição territorial”, “leis de transferência de potencial construtivo”, etc.
No Senado, ainda, para onde seguirá, caso os deputados aceitem a submissão à
FIFA, a Lei Geral se associará a pelo
menos outros dois PLs (394/09 e 728/11) que, entre outras propostas, restringem
o direito à greve a partir de três meses antes da Copa, abrem a possibilidade
de proibição administrativa de ingresso de torcedores em estádios por até 120
dias, inventam o tipo penal de “terrorismo” – hoje inexistente no Brasil – e
estabelecem justiças e procedimentos de urgência para julgá-lo. Criam, ainda,
as chamadas “Zonas Limpas”, de exclusividade da FIFA nas cidades e privatizam o
hino, símbolos, expressões e nomes para a Confederação Brasileira de Futebol –
a tão “idônea” CBF.
A FIFA manda e desmanda,
desrespeita e humilha as populações mundo afora. O povo brasileiro, hoje, é a
“bola da vez”. Ela deseja construir um reinado de exploração itinerante durante
seu evento, para o qual o Estado assume o duplo papel de “policial” –
reprimindo, criminalizando e encarcerando sua sociedade – e de “financiador” –
assumindo os ônus, riscos e a responsabilidade desta empreitada privada. A Lei
Geral da Copa está no centro de todo este processo e consolidará, caso seja aprovada,
uma Copa do Mundo excludente e com graves prejuízos ao povo brasileiro.
Dentre outras premissas, o projeto a ser
votado na Câmara:
a) Preconiza a retirada de direitos
conquistados por vários grupos sociais, como a meia-entrada e outros direitos
dos consumidores (Artigo 26);
b) Restringe seriamente o comércio de rua
e popular durantes os jogos (Artigo 11);
c) Impede que o povo brasileiro possa
assistir aos jogos como achar melhor, limitando a transmissão por rádio,
internet e em bares e restaurantes (Artigo 16, inciso IV);
d) Coloca a União em posição de submissão
à FIFA, sendo responsável por quaisquer danos e prejuízos de um evento privado
(artigo 22, 23 e 24);
e) Cria novos tipos penais e restringe a
liberdade de expressão e a criatividade brasileira. Chargistas, imprensa e toda
a torcida que usar os símbolos da Copa podem ser processados (Artigos 31 a 34);
f) Desestrutura o Estatuto do Torcedor em
favor do monopólio da FIFA (Art. 67);
g) Coloca em risco o direito à educação,
pela possível redução do calendário escolar (Artigo 63);
h) Permite a venda de bebidas alcoólicas
durante os jogos, retrocedendo em relação à legislação existente (Artigo 29);
i) Transforma o INPI (Instituto Nacional
de Propriedade Industrial) numa espécie de “cartório particular”, abrindo
caminho para abusos nas reservas de patente (Artigo 4 a 7) e na privatização de
símbolos oficiais e do patrimônio cultural popular.
Dessa forma, a Articulação
Nacional dos Comitês Populares da Copa (ANCOP, organizada nas 12 cidades sede e
constituída por diversas entidades da sociedade civil que lutam para enfrentar,
impedir e minimizar os prejuízos sociais advindos com a Copa, mais uma vez, vem
a público repudiar este ato de submissão brasileira perante os interesses
privados de grandes monopólios da FIFA e seus patrocinadores, totalmente
financiados com recursos públicos, atropelando direitos e garantias arduamente
conquistados, ferindo princípios democráticos e onerando o povo brasileiro.
O Brasil tem condições
objetivas de sediar a Copa do Mundo sem produzir este legado autoritário e
anti-democrático. Já sediamos grandes eventos, dos mais diversos tipos. A
aprovação de novas leis não é necessária e representa um cavalo-de-tróia para
modificações que, supostamente transitórias, terminam por incorporar-se
definitivamente em nosso direito interno.
À luz disso, os Comitês
Populares da Copa vêm exigir do Poder Legislativo brasileiro, na figura de
todos os congressistas, que formalize o veto que a população já deu ao PL
2330/2011, votando contrários ao mesmo. Sabemos que isso não ocorrerá sem
pressão e mobilização popular e, portanto, estaremos atentos para legitimamente
defender a justiça social e a soberania popular acima de tudo.
Assim não dá jogo! Queremos
respeito às regras e leis já existentes na Constituição Federal que garantem ao
povo brasileiro direitos e soberania.
As exigências da FIFA são um GOL
contra o povo brasileiro.
FIFA BAIXA A BOLA!
A Articulação
Nacional dos Comitês Populares da Copa (ANCOP) é formada pelos Comitês
Populares nas 12 cidades-sede da Copa: Belo Horizonte, Brasília, Cuiabá,
Curitiba, Fortaleza, Manaus, Natal, Porto Alegre, Recife, Rio de Janeiro,
Salvador e São Paulo. Mais informações em www.portalpopulardacopa.org.br
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